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Seu cérebro é como um chumaço de papel

Os cérebros dos mamíferos são constituídos de dobras bem elaboradas. De acordo com uma nova pesquisa, esses dobramentos não são originados através de processos sutis que variam de espécie para espécie, mas sim, à partir de um mesmo processo físico simples, que segue uma lei de escala matemática.

A dobragem no cérebro dos mamíferos tem uma função muito importante: aumentar a área de córtex cerebral, a camada exterior de matéria cinzenta, onde residem os neurônios. Porém, nem todos os mamíferos tem córtex dobrados. Os camundongos e ratos são ‘lissencéfalos’, ou seja, possuem um cérebro de superfície lisa. Por outro lado, primatas, baleias, cães, gatos, tem cérebros dobrados e são ‘girencéfalos’.

Seu cerebro e como um chumaco de papel

Durante décadas os cientistas tem tentado encontrar as relações entre a quantidade de dobras e as características dos cérebros de várias espécies de mamíferos. Porém, ainda não encontraram nenhuma relação significativa.

Mas agora, Suzana Herculano-Houzel e Bruno Mota – neurocientista e físico, respectivamente, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, encontraram uma relação matemática no processo de formação de dobras nos cérebros dos mamíferos que parece ser universal.

Usando dados de 62 espécies diferentes, a dupla representa graficamente a área de córtex vezes a raiz quadrada da sua espessura em relação à área exposta do cérebro. Todos os pontos dos dados caem sobre uma curva universal única – para ambas espécies lissencéfalas e girencéfalas, conforme relataram na revista Science.

Esta curva unificada mostra que a combinação da área total e a espessura aumentam com a área exterior do cérebro exposta, seguindo a então lógica matemática.

Pode parecer complicado, mas esta relação universal é a mesma que descreve maços de papel amarrotados, como Suzana Herculano-Houzel mostrou, amassando folhas de papel de diferentes tamanhos e espessuras e medindo suas áreas de superfície.

A relação se dá, segundo os autores, porque quando o papel é amassado ele se configura de uma forma que oferece menos gasto de energia mecânica. Assim, presumivelmente, na dobragem, o córtex também se instala simplesmente para a configuração de energia menos mecânica possível.

“Em biologia, é raro encontrar uma relação matemática que tão firmemente se encaixa em todos os dados”, diz Georg Striedter, um neurocientista da Universidade da Califórnia, em Irvine. “Eles capturaram algo”, diz ele. Ainda assim, Striedter argumenta que a lei de escala descreve um padrão entre os cérebros plenamente desenvolvidos e não explica como a dobradura em um cérebro em desenvolvimento acontece.

Striedter argumenta que a analogia com o papel amassado não é totalmente confiável. “O papel é exposto a forças externas aplicadas pelas mãos, enquanto as forças no córtex presumivelmente surgem internamente. Os cientistas ainda têm que determinar como surgem essas forças e como ocorre a dobragem”, diz Striedter, que é co-autor de um comentário sobre o artigo de Suzana e Bruno, que também foi publicado na Science. “Alguns modelos sugerem que as dobras do córtex da camada exterior cresce mais rápido do que a camada interna. A relação de escala é uma coisa, o mecanismo de como você chega lá é outra”, diz Striedter.

No entanto, Herculano-Houzel vê de forma diferente. “Em todas as fases de desenvolvimento, o crescimento do córtex é de fato sujeito à força externa do crânio”, diz ela. “Assim, como o córtex cresce num espaço delimitado, ele deve dobras, e em todas as fases do desenvolvimento, a relação de escala deve atuar”. Se a relação de escala atua em todas as fases de desenvolvimento, ela diz, então não há necessidade de outro mecanismo para explicar o processo de dobragem do córtex.

Veja o artigo de Suzana Herculano-Houzel e Bruno Mota:
http://www.sciencemag.org/lookup/doi/10.1126/science.aaa9101

Veja os comentários de Striedter e outros autores:
http://www.sciencemag.org/lookup/doi/10.1126/science.aac6531

Guellity Marcel
Guellity Marcel
Biólogo, mestre em ecologia e conservação, blogger e comunicador científico, amante da vida selvagem com grande interesse pelo empreendedorismo e soluções de problemas socioambientais.
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